Este é um dos sectores em que Portugal mais evoluiu desde o 25 de Abril: tínhamos um ensino superior apenas destinado a elites restritas, que, mesmo se ainda continuamos abaixo das médias europeias quanto ao seu acesso e sucesso, se democratizou socialmente e multiplicou por 10 vezes a sua frequência.
Mas todo o sistema de ensino superior tem vindo a ser atacado pelos sucessivos governos que o foram progressivamente destruindo. A Universidade é cada vez menos uma instituição de produção de conhecimento e de formação do pensamento crítico para ser uma organização de prestação de serviços como se de uma qualquer consultora se tratasse. No nosso país estamos cada vez mais perante um sistema de Educação e Ensino socialmente discriminatório e que funciona como veículo de inculcação da ideologia dominante, reproduzindo um sistema social injusto, classista e desigual.
Na investigação científica o investimento tem-se alimentado e alimenta-se da exploração vergonhosa da precariedade de doutorandos e pós-doutorados, chamados a exercer funções essenciais nas instituições de ensino superior, bem como nos centros de I&D e laboratórios de estado que ainda conseguiram sobreviver à extinção/redução de financiamento, quando estes docentes e investigadores deveriam ser integrados numa carreira digna, docente ou de investigação. A investigação faz-se cada vez mais com supostas “almofadas financeiras” que têm que ser adiantadas pelas instituições.
Desde há bastantes anos que o financiamento público do ensino superior tem vindo a regredir, estrangulando-o completamente: além da degradação das condições de trabalho e estudo da maioria das instituições, foram congeladas admissões e concursos, levando ao envelhecimento continuado do corpo docente e ao acentuar da sua precarização. Criou-se uma avaliação de desempenho que não é universal para todas as instituições e que , nalgumas instituições, é pautada pelas mais escandalosas arbitrariedades, abriu-se a porta para a desregulação das carreiras, empurrando regulamentações fundamentais para a decisão de cada instituição, permitindo assim o acentuar de desigualdades de funções e direitos entre docentes. Com o novo o RJIES, centralizaram-se as decisões da vida das instituições, tornando-as menos democráticas e atacando a colegialidade dos órgãos de gestão. Hoje o financiamento pelo Estado das universidades e institutos politécnicos é pouco menos que indigente – já nem sequer cobre os salários do seu pessoal docente e não docente, embora estes sejam funcionários públicos – e as instituições consomem boa parte das suas atividades na angariação de verbas próprias, sem as quais nem sequer sobreviveriam. Aliás, quer RJIES, quer os estatutos de carreiras, acabaram por abrir a porta para transformar o docente num angariador de fundos. Acresce a diminuição de atratividade do ensino superior, fruto de campanhas mediáticas sobre a inutilidade da sua frequência, que leva a que cerca de metade dos alunos que concluem com sucesso o ensino secundário nem sequer tente inscrever-se no ensino superior. Mas o principal obstáculo à frequência no Ensino Superior, são os custos de frequência e as propinas, além de que a Ação Social Escolar, que chega a cada vez menos alunos, é ridiculamente restrita e atribuída demasiado tarde para as necessidades dos alunos. Se considerarmos ainda os custos para a família para que um aluno frequente uma licenciatura os livros, a alimentação, as deslocações e o alojamento, percebemos por que razão diminuiu a frequência da generalidade dos cursos superiores. A falta de alunos é sentida de forma diferente pelas instituições do interior e de regiões de menor densidade de população, cujas dificuldades são bastante mais graves do que nas áreas mais urbanas e povoadas do litoral e dos principais centros urbanos.
Relativamente à ciência e à política de investigação, o SPGL e a FENPROF sempre criticaram o facto de a maior parte do aumento do número de investigadores ser obtida em condições de elevada precariedade (bolsas e contratos a prazo), e não por contratos dentro do estatuto de carreira. A atual equipa da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) ) e o Ministério da Educação e Ciência encomendaram à European Science Foundation uma pseudo-avaliação que excluísse de financiamento significativo 50% dos centros de investigação e também reduziram para cerca de um terço as bolsas e contratos de investigação. Como nem sequer houve transparência nos processos, e não tiveram pejo em não cumprir a legislação, até o próprio MEC teve de prometer uma auditoria externa ao processo de avaliação para tentar calar os protestos.
Impõe-se um financiamento público das instituições que lhes permita funcionar em boas condições, terminar com os bloqueios da carreiras e permitir admissões e concursos para contrariar o envelhecimento do corpo docente, bem como promover o ensino superior como um meio de desenvolvimento integral dos jovens e adultos, e um contributo essencial para o progresso sustentável e o desenvolvimento de Portugal, um país onde não “há diplomados em excesso”, pelo contrário.
É necessário reforçar o sistema científico e tecnológico através do apoio aos laboratórios do Estado, de financiamento plurianual para a investigação para as universidades e institutos politécnicos, laboratórios e centros I&D, bem como desenvolver políticas ativas de atração de investigadores através da criação de condições de trabalho dignas, com vínculos, e devidamente enquadradas numa carreira.
A luta por melhores salários, pelo descongelamento das progressões nas carreiras e por uma diminuição da fiscalidade sobre os rendimentos do trabalho impõe-se, seja no quadro da FENPROF, no âmbito da administração pública com a Frente Comum, seja no quadro mais geral com a CGTP-IN. A organização dos e das docentes para a necessária luta por melhores condições de vida constitui um dos eixos centrais da Lista V.
Defendemos o descongelamento imediato das carreiras docentes e a recuperação integral do tempo de serviço abusivamente roubado e pugnaremos ainda pela extinção de mecanismos perversos e espúrios de condicionamento da progressão.
Para as batalhas que se avizinham, necessitamos de um SPGL forte, coeso e combativo. Os sindicatos têm como principal objectivo defender os direitos dos seus associados bem como a escola pública, democrática e de qualidade para todos ao invés de procurarem estratégias que representam perda de terreno e influência dos mesmos na luta.
ALGUNS TÓPICOS DE ACTUAÇÃO NO ENSINO SUPERIOR E INVESTIGAÇÃO
Combate à precarização do sector (sobretudo na investigação): os contratos devem respeitar os estatutos de carreira, a Carta Europeia do Investigador e as recomendação da UNESCO. Sobretudo nos institutos politécnicos, os docentes convidados que não tiveram condições, por responsabilidade do Estado ou da instituição, para concluir o seu doutoramento e entrar na carreira, devem ter um prazo alargado em que essas condições lhes sejam dadas.
Luta contra a manutenção das carreiras bloqueadas e de enormes limitações para os concursos de admissão e de progressão nas carreiras.
Fim do défice democrático (e da centralização de poderes em diretores, presidentes e reitores) nas instituições: defesa da colegialidade dos órgãos de gestão e da transparência nas decisões e da própria gestão das instituições. É preciso uma gestão democrática nas instituições, algo que foi destruído pelo RJIES (que por sua vez abriu portas para uma lógica de privatização do Ensino Superior Público).
Oposição ativa ao subfinanciamento estatal do ensino superior e da investigação, apoiando os esforços de outras entidades que também atuem nestes domínios (como outros sindicatos e ABIC), de forma a confrontar o próximo governo com uma plataforma alargada em defesa do financiamento público de um sector tão essencial ao futuro do País.
Defesa intransigente da autonomia das instituições (e da liberdade académica dos docentes), no respeito pela transparência do seu funcionamento, em que devem colaborar as associações sindicais;
Reorganização da rede de ensino superior resultante da vontade expressa das instituições e não da imposição do Governo.
Negociação de um acordo com as instituições privadas para definir as carreiras e os estatutos deste sector.
Fim à lógica economicista introduzida a pretexto do processo de Bolonha, e investimento numa universidade que contribua para a formação integral do indivíduo e que prepare de facto os diplomados para a vida ativa.
Reforçar o controlo da regulamentação local do sistema de avaliação de desempenho na lógica de uma opção por um sistema universal e transparente.
Acabar com a desregulamentação que progressivamente vem atingindo as carreiras docentes e de investigação.
Fortalecer o Ensino Superior Público, não permitindo a sua destruição, fragmentação ou mercantilização via instrumentos que têm atuado em conjunto para pôr em questão a sua sobrevivência com qualidade.
Exigir o cumprimento do número de horas máximo legal para o serviço letivo, de forma a terminar com as situações de exploração e de desgaste pessoal de muitos docentes.
Fortalecer o sindicato dando de novo destaque à luta em cada escola, aos delegados sindicais, sindicalizando docentes e investigadores no SPGL através da participação na luta, em medidas concretas do dia-a-dia em cada escola, em cada universidade solidarizando-se com as lutas globais que digam respeito a todos os investigadores e/ou docentes.
O SPGL e a FENPROF, NO ENSINO SUPERIOR E INVESTIGAÇÃO, têm de assumir um papel ativo na defesa dos seus associados e voltar a ter influência nas escolas: quem não luta, perde sempre!